segunda-feira, 11 de novembro de 2013

Entrevista com o Rev. Ageu Magalhães

O reverendo Ageu é ministro presbiteriano desde 1998, recebeu de Deus uma família (esposa e três filhos), pastoreia uma Igreja Presbiteriana na capital paulista, e é presidente de Sínodo. Também tem o privilégio de ser diretor do reconhecidíssmo Seminário Teológico Presbiteriano Rev. José Manoel da Conceição, o JMC.

As perguntas ao Reverendo Ageu são indagações de um ponto de vista leigo, a um pastor presbiteriano que responderá tendo suas perspectivas sobre cada aspecto, levando em consideração seu conhecimento das interpretações da IPB a respeito de cada tema. A voz dele não é a voz da IPB, que se pronúncia por meio da sua Presidência e Comissão Executiva.
Minhas questões estarão em itálico e as respostas dele em negrito.

1. Reverendo Ageu, desde quando o Sr. é presbiteriano?

R: Eu tive o privilégio de nascer em um lar presbiteriano. Meu Tataravô, Joaquim Cândido de Sena, católico praticante, no sertão do Ceará, começou a ler uma Bíblia na biblioteca do padre e converteu-se ao protestantismo. A história inteira desta conversão é maravilhosa, mas, resumindo, desde esta conversão, pela graça de Deus, eu sou o oitavo pastor da família.

2. O que mais te impressiona nesse sistema teológico chamado presbiteriano, ou Reformado?

R: A fidelidade às Escrituras. Tudo no sistema reformado tem de ter base bíblica. É certo que há denominações que também advogam ter esta base, mas estão por caminhos estranhos. Creio que isso se deve a uma forma equivocada de interpretar as Escrituras. No nosso sistema, até o método de interpretação (hermenêutica) está submisso à Palavra. A regra principal é que as próprias Escrituras interpretam as Escrituras.

3. O presbiterianismo brasileiro, pela graça de Deus, não caiu no liberalismo teológico. O que mais Deus tem usado para nos manter firmes na ortodoxia cristã?

R: Sem dúvida alguma a subscrição confessional. Denominações que se desvincularam de Confissões de Fé reformadas ou relativizaram sua importância, aos poucos caíram no liberalismo.

4. Isso não significa que não existam ameaças nessa direção. O liberalismo teológico sempre ‘ronda os seminários’. A IPB toma decisões enérgicas a respeito?

R: Sim. Sempre que sobem documentos ao Supremo Concílio com denúncias de liberalismo, providências são tomadas. O problema é a omissão dos concílios que, muitas vezes, não querem se envolver no problema. 

5. O movimento de ‘Falar em línguas’ já foi um assunto febril no ceio presbiteriano, até que os neopentecostais cresceram vertiginosamente, sem a ênfase de falar em línguas, o que levou os da ‘renovação carismática’ a perderem o discurso de que precisamos de “poder”. Depois veio o movimento da Batalha Espiritual, que foi solapado, especialmente, pelo Rev. Nicodemus, entre outros. Hoje, são os movimentos das “Comunidades Presbiterianas”. Por qual motivo muitos não confiam na sua identidade Reformada e sempre ficam contrabandeando métodos questionáveis?

R: É muito louvável o impulso evangelístico das comunidades presbiterianas. É piedoso o desejo de ver igrejas crescendo e mais gente recebendo a Cristo como Salvador. O equivocado, a meu ver, é a confiança em métodos. Estes irmãos, ao buscarem crescimento de suas igrejas importando métodos norte-americanos, acabam desconsiderando o poder do Evangelho. Como disse o Rev. Hernandes Dias Lopes, citando E. M. Bounds, “Nós estamos procurando melhores métodos. Deus está procurando melhores homens. Deus não unge métodos, Deus unge homens." Além disso, a metodologia empregada é antropocêntrica. A eclesiologia é remodelada. O culto, por exemplo, deixa de ter o objetivo principal de reunir o corpo de Cristo para comunhão e passa a ser um encontro que visa atingir o não crente, com linguagem e tema voltados para ele. Não é isso o que a Bíblia nos ensina. A igreja deve equipar os crentes para buscarem os perdidos fora da igreja e não dentro dela. E aquele que se converte verdadeiramente a Jesus Cristo, seja em um grupo nos lares ou em um discipulado, quando chega à igreja, pouco se importa se ela tem arquitetura do século 16 ou do século atual. Ele não estará ali pela estética, mas porque foi salvo pela graça de Deus e precisa de Cristo.

6. O que acha desse meu ‘sonho’: disponibilizar os Símbolos de Fé de Westminster, em formato de revista da EBD a todo presbiteriano?

R: Acho muito boa a ideia. A Confissão de Fé e os Catecismos são verdadeiros tesouros. Todo crente deveria tê-los em mãos.

7. Os pastores presbiterianos passam de 4 a 5 anos sendo ‘ensinados e examinados’, até serem ordenados. Já não passou da hora dos outros ‘pastores’, os presbíteros, serem sabatinados com alguma orientação teológica, como pressupõem a Constituição da IPB?

R: Sim. É isso o que prescreve o Art. 28 da Constituição. Tanto presbíteros quanto diáconos devem crer nas Escrituras como Palavra de Deus e nos Símbolos de Fé como sistema expositivo de doutrina e prática.

8. Não temos uma voz de reconhecimento público, no contexto político e da mídia. Obviamente, não significa que não temos locutor com tal calibre. Grandes questões sociais que nos interessam dogmaticamente estão, pela graça de Deus, sendo defendidas pelo Dep. e Pr. Marcos Feliciano e Silas Malafaia. Por quais motivos o calvinismo não mostrou sua força nessas áreas aqui no Brasil?

R: Não sei responder. No passado o Caio Fábio foi um calvinista ouvido pela sociedade, mas foi sabotado pela política e sua vida pessoal deixou de ser modelo de piedade. Hoje o Marcos Feliciano e o Malafaia aparecem mais pela polêmica do que pela fidelidade às Escrituras. Quando comparados a John Newton, William Wilberforce e a Abraham Kuyper percebemos o quão distantes estamos de um homem de fé com influência real na sociedade.

9. Reverendo, o acumulo de pastores presbiterianos em grandes centros, e a necessidade sempre premente de obreiros em campos missionários, não revela-nos que estamos tendo na IPB uma crise vocacional? Entre os vários motivos, concorda com muitos irmãos que o “academicismo” tem sido um dos fatores contribuintes para esse cenário?

R: Eu creio que os seminários são responsáveis em incutir na mente do candidato, contra a tendência do século, que ele deve ir aonde Deus enviar. O pastor não deve buscar conforto para si, mas ser fiel ao chamado de Deus. De fato, o academicismo pode representar um perigo para a igreja. Os títulos acadêmicos devem ser utilizados para o benefício do Reino e o aperfeiçoamento das ovelhas de Cristo. Se usados para envaidecimento, se tornam uma maldição.

10. EBD é instrumento de ensino eficaz no contexto presbiteriano, não apenas pela viabilidade, mas por princípios de fé, já que é no Dia do Senhor. Existe algo que podemos fazer para que essa bendita escola continue forte [e seja resgatada em algumas igrejas]?

R: O treinamento dos professores da Escola Dominical é essencial. Material de qualidade tem sido produzido pela nossa Editora Cultura Cristã, porém, um professor que ministra a aula apenas lendo a revista, terá dificuldades no processo de ensino. O ideal é que as Escolas Dominicais tenham bom material didático, com linha teológica sadia, e professores dedicados, criativos e tementes a Deus, para que o processo todo seja abençoado.

11. Por falar em Domingo, a editora lançou uma recente edição com notas da Constituição da IPB. Não existe nenhum apontamento a respeito desse assunto, como que se não fosse um assunto largamente desobedecido na IPB. Eu sei que a maioria dos pastores conscientes desse assunto é mais ‘calvinista’ do que ‘puritana’. Até quando a IPB vai omitir-se de debater a respeito?

R: Eu fiz parte da comissão que produziu o Manual Presbiteriano com Notas Remissivas e o foco da comissão não foi teológico, mas legal. Nossa missão foi restaurar os diplomas legais da IPB e inserir notas relacionando decisões do Digesto Presbiteriano aos artigos do Manual. De fato, o 4º mandamento talvez seja o mais esquecido em nossos dias. Quanto aos pastores que discordam dos Símbolos de Fé neste ponto, apelando para Calvino, eu recomendaria a leitura do artigo “Os Puritanos e o Dia do Senhor” de J.I. Packer, no livro “Entre os Gigantes de Deus”, Editora Fiel. Packer analisa os dois pensamentos.

 12. Outro assunto espinhoso – dízimo ao Supremo Concílio. Por qual motivo presbitérios e igrejas ainda mostram-se desobedientes, constitucionalmente, e não enviam o que devem enviar ao SC? Tais ministros que estão na presidência desses Concílios não percebem o mal que fazem e a incoerência que vivem, já que é esta mesma Constituição lhes dá a proteção necessária?

R: Realmente trata-se de desobediência à Constituição da IPB, uma quebra do pacto federativo. Como podem estes Conselhos instar os membros da Igreja a serem fiéis nos dízimos e ofertas se o próprio Conselho não cumpre suas obrigações conciliares?

13. Deus é dono da IPB. Ano que vem teremos eleição, independentemente do acontecer, quais desafios a IPB tem pela frente?

R: Na minha limitada visão, os desafios são grandes. Muitas igrejas têm enfraquecido por desconsiderar os meios de graça. É preciso um esforço nacional para que os crentes voltem a ler a Bíblia, a orar e a evangelizar. A partir desta mudança, as demais áreas da denominação seriam impactadas.

14. Só uma curiosidade, qual seu autor preferido?

R: Permita-me citar alguns: Agostinho, Calvino, Pink, Packer, MacArthur e Joel Beeke.

15. No currículo dos Seminários da IPB, não tem heresiologia? Sei que com o ensino de uma boa teologia sistemática, obviamente as heresias serão identificadas, mas não acredita que conhecer as seitas principais seria uma proteção para o ministério pastoral?

R: Com certeza este estudo é necessário. No currículo atual, na grade de disciplinas eletivas, temos Apologética, Neopentecostalismo, Catolicismo Popular e Culto Afro-brasileiro e Denominações e Seitas.

16. Deixe uma mensagem para causa apologética:


Os apologistas têm sido usados por Deus no decorrer da história. A atuação deles nos primeiros séculos da Igreja, produzindo credos e confissões, foi vital para a condenação das heresias, e o fortalecimento e expansão da Igreja. Minha mensagem a vocês que lidam nesta área é de encorajamento. Não se intimidem com as pressões e continuem denunciando o erro. Há eleitos de Deus, neste momento, sendo enganados pelas seitas. Um dia Deus abrirá seus olhos conduzindo-os à verdade. Os institutos apologéticos podem ajudar muito neste processo. Que Deus os abençoe.


Um comentário:

  1. Boas perguntas com igualmente boas respostas. Que Deus os abençoe e continue dando discernimento.

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