segunda-feira, 19 de setembro de 2011

Sobre ciência e fé... 3

por Lucio A. de Oliveira

Ainda há outras questões, que, como as já mencionadas acima (causalidade; realidade do mundo exterior) são essenciais à ciência, e também são pressupostas. É interessante observar que cientistas de grande proeminência sequer percebem os passos de fé que dão ao fazer ciência. Seu discurso é de que eles são exatamente objetivos, fiéis aos fatos, sem que crenças sejam tragas à baila.
Parece que a utopia positivista de Comte ainda está entranhada no pensamento científico hodierno. Nas palavras de Comte:

"Reconhece de agora em diante, como regra fundamental, que toda proposição que não seja estritamente redutível ao simples enunciado de um fato particular ou geral, não pode oferecer nenhum sentido real e inteligível. Os princípios que emprega são apenas fatos verdadeiros..." (COMTE apud ALVES, 2008, p. 136).

Presume-se que o cientista não possui nenhum insight pístico, e “sua ciência dispõe de um método que torna possível um discurso totalmente fiel ao objeto, do qual o sujeito se ausentou” (ALVES, 2008, p.155). O cientista é tido como aquele que é isento de pressuposições, de qualquer pré-conceito, que assumem "o programa de não dizer mais que aquilo que os fatos nos autorizam" (ALVES, 2008, p..136). 
Porém, com os pressupostos supracitados, e os que observaremos adiante, devemos abandonar o pressuposto que nossos tempos criou. Nas palavras de Alvin Gouldner, é necessário: “abandonar o pressuposto muito humano, mas elitista, de que os outros creem movidos por interesses, enquanto eles (os cientistas) creem em obediência aos ditames da lógica e da razão” (GOULDNER apud ALVES, 2008, p.157).


3 – O passado


No anime Full Metal Alquimist Brotherhood, no episódio nono, Alphonse Elric, um construto que tivera sua alma presa à armadura vazia que corresponde ao personagem, questiona-se, instigado por um mal feitor, se ele na verdade não seria um boneco, e que as lembranças que ele tem do passado não tivessem sido todas inseridas nele por processos mágicos semelhante aos que aprisionaram sua alma na armadura. Alphonse expressa-se assim: “O que chamamos de memória não passa de informações. E isso poderia facilmente ser criado artificialmente”. Isso serve para ilustrar a questão de que pressupomos que aquilo que chamamos de memória realmente corresponde ao passado. Wolterstorff coloca assim: “...somos todos constituídos de tal maneira que, com base em memórias de experiências em certas situações, somos dispostos a manter algumas crenças sobre o passado” (WOLTERSTORFF apud NASH, 2008, p.298).
O fato é que, para provarmos que o passado é real, temos de nos valer das informações de nossa mente, da memória.  Craig elucida: "Pense na convicção de que o mundo não foi criado cinco minutos atrás com recordações implantadas, alimentos do café da manhã no estômago que na verdade nunca ingerimos e outras indicações de idade. Certamente é racilonal crer que o mundo existe há mais de cinco minutos, apesar de não haver evidências para isso" (CRAIG, 2004, p.28). 
Ainda acrescento que não é necessário admitir uma cosmovisão teísta para que tenhamos sido criados (basta ler o Hawking, que não sabemos se é teísta ou ateu, e você verá). Uma própria cosmovisão naturalista admite que o homem surge de alguma forma, e uma cosmovisão destas, que admita que a formação impessoal de nossas mentes carregue informações inaturas, pode possibilitar a ideia de que nossas memórias também sejam informações inatas, e não experiências.
De uma forma ou de outra, somado à questão de que o mundo exterior pode ser uma mera projeção mental, a possibilidade de que tenhamos sido criados a cinco minutos atrás com todas as memórias embutidas é muito razoável.

continua...
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Bibliografia:


ALVES, Rubem. Filosofia da ciência: introdução ao jogo e a suas regras. 13. ed. São Paulo: Loyola, 2008. 224 p.
CRAIG, William Lane Craig. A veracidade da fé cristã: uma apologética contemporânea. Tradução de Hans Udo Fuchs. São Paulo:Vida Nova, 2004. 309 p.
NASH, Ronald H. Questões Últimas da vida: uma introdução à filosofia. Tradução de Wadislau Martins Gomes. São Paulo: Cultura Cristã, 2008. 448 p.

3 comentários:

  1. Fantástico!

    "É interessante observar que cientistas de grande proeminência sequer percebem os passos de fé que dão ao fazer ciência."...

    Cara...

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  2. Paz Luciano!

    Rapa, quero lhe convidar para postar alguns comentários em uma pagina de ateus.

    Já deixei alguns lá.
    http://encontroracional.blogspot.com/

    Se não puder, fica tranquilo, pois sei que não é facil arrumar tempo para fazer tudo que desejamos.

    Jean Patrik

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  3. Irmão Jean, satisfação receber sua visita.

    Mas deixo esse convite ao outro integrante do MCA - Lucio e o irmão dele, meu chará, Luciano.

    Eles vão passar lá... pode deixar.

    Eu tb quero ver o blog.

    abração meu irmão.

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