domingo, 11 de dezembro de 2011

COSMOVISÃO parte 2

OBJEÇÕES CONTRA O ESTUDO DE COSMOVISÃO                            por Lucio Antônio de Oliveira

Jostein Gaardner, no seu famoso ‘O mundo de Sofia’, expondo Marx, escreve que:

De modo muito geral, podemos dizer que a era dos grandes sistemas filosóficos terminou com Hegel. Depois dele, a filosofia toma um novo rumo. Os grandes sistemas especulativos dão lugar às ’filosofias da existência’ ou ‘filosofia da ação’, como também podemos chama-las. É a isso que Marx se refere quando diz que até então os filósofos sempre tinham tentado interpretar o mundo, em vez de tentar modifica-lo. E são exatamente essas palavras que determinam uma virada importante na história da filosofia (GAARDNER, 1996, p.418).

Mais adiante, Gaardner afirma que a filosofia termina em Sartre e o existencialismo como os últimos sistemas filosóficos, e que, o que temos agora, são renovações, ressurgimentos de sistemas antigos (cf. GAARDNER, 1996, p.492-493). Uma declaração em especial merece destaque: “...as perguntas com as quais começamos este curso ainda não foram respondidas” (GAARDNER, 1996, p.492).
É exatamente isso o que Ronald Nash tinha em mente quando observa um desafio ao estudo de sistemas conceituais. Ele observa que as pessoas observam que sistemas muito bem conceituados como os de Platão e Aristóteles possuem inconsistências, problemas, e ficam sem esperança de que se possa admitir um sistema conceitual (isto é, uma cosmovisão) verdadeiro (talvez aqui se encaixe o ceticismo da última citação que fizemos de Gaardner). Hegel e cia, observa Nash, pioraram bastante as coisas quando “construíram sistemas conceituais que pareciam menos ainda tentar entender a realidade, sendo mais um esforço para encaixar o mundo em compartimentos artificiais e arbitrários” (NASH, 2008, p. 23).
Assim, o que aconteceu foi que “muitos filósofos americanos e britânicos se afastaram da construção de sistemas e concentraram seus esforços na aquisição de melhor entendimento de questões isoladas, de problemas e de enigmas” (NASH, 2008, p.23); ou ainda, nas palavras de Corliss Lamont, “filósofos contemporâneos tendem a se confiar a certos problemas e áreas circunscritos, em vez de atacar com coragem a questão de uma cosmovisão...” (LAMONT apud NASH, 2008, p.23).
A refutação de Nash, seguindo e ampliando Lamont silenciam essa objeção, de modo que não precisamos recorrer a outra fonte. Lamont observa que os filósofos analíticos [filosofia analítica é “uma maneira de entendera filosofia preferida por muitos filósofos britânicos e americanos recentes que aplicam a análise filosófica a problemas particulares, tendendo a ignorar a antiga prática de construção de sistemas filosóficos” (NASH, 2008, p.428)] e afins

 não podem realmente escapar da responsabilidade do esforço para prover uma resposta sistemática com respeito aos assuntos principais da filosofia [presumimos que ele esteja se referindo às questões últimas], por mais incompletas e experimentais que possam ser suas conclusões (LAMONT apud NASH, 2008, p.23).

E Nash observa, semelhantemente, que todo filósofo analista tem uma cosmovisão, mesmo que não saibam.
Ainda, uma observação perspicaz, pertinente e plausível deve ser feita. Temos de lidar com uma questão natural que surge quando estudamos esse assunto. É a questão da pluralidade, aparentemente infinita, de cosmovisões. O pluralismo hodierno reforça a confusão, e faz-nos pensar que escolher uma cosmovisão parece um desafio semelhante ao dizer qual é a estrela mais brilhante que existe. Nash observa que “muitas pessoas estão confusas, e o que torna a situação mais depressiva é a inabilidade delas para ver a própria confusão” (NASH, 2008, p. 25), de modo que pessoas passam até a colocar “fragmentos de cosmovisões, lado a lado, sem pensar sobre a incompatibilidade [a questão da incompatibilidade, ou incoerência, é um dos itens que desclassificam uma cosmovisão, como veremos doravante] deles” (MOUW apud NASH, 2008, p.26). Porém, aqui Sire faz boas colocações: “O fato é que, embora, a princípio, as cosmovisões pareçam proliferar, elas são constituídas de respostas a questões para as quais há apenas um limitado número de respostas” (SIRE, 2008, p.303); e “... quando examinamos cada opção, descobrimos que cada uma delas é uma subdivisão ou uma versão específica de uma ou mais opções já discutidas [no livro]” (SIRE, 2008, p.302).
Há ainda, para finalizar, aqueles que acham desnecessário nos preocuparmos com as questões últimas agora. Eles falam como se isso estivesse num alto nível especulativo (como foi o caso de Hegel e cia.), e que na prática não fosse algo relevante (presumimos ser isso uma influência de Marx). Cheung observa que “algumas pessoas dizem que pretendem refletir sobre as questões últimas quando estiverem velhas, se tornarem ricas ou se aposentarem” (CHEUNG, 2009, p.56-57); e “ ‘As pessoas não se importam com as questões últimas da vida’, disse um experiente negociante. ‘As pessoas se importam com dinheiro. Elas se importam com sua aparência pessoal. Elas querem ter mais tempo para o lazer, maior conforto físico...’” (HEEREN apud CHEUNG, 2009, p.55).
O que os detentores te tais posições não perceberam, é que eles também têm uma cosmovisão, e que pensaram desta maneira, conceberam tal pensamento, dentro de um sistema conceitual (ainda que, como acontece na maioria dos casos, não muito bem elaborado).

As questões últimas são inevitáveis, e quem nunca deliberou e sinceramente considerou sua importância faz, contudo, inevitavelmente diversas suposições a seu respeito e então deriva uma posição pessoal sobre diversas questões subsidiárias com base em suas suposições sobre as questões últimas [...] Portanto, as pessoas não apenas devem ter essas questões em mente como também lhes dar a prioridade mais alta, propondo-se desde já a refletir a seu respeito (CHEUNG, 2009, p.59).

Sire também é incisivo:

Sempre que refletimos sobre alguma coisas, desde um pensamento casual (Onde será que deixei o meu relógio?) até uma questão profunda (Quem sou eu?), estamos operando dentro de uma estrutura. Defato, somente a hipótese de uma cosmovisão, ainda que seja básica ou simples, é que nos permite pensar (SIRE, 2009, p.15).

De fato, não podemos dar importância ao mundo a nosso redor a menos que pensemos que ele realmente exista (metafísica), que corresponde ao que percebemos pelos sentidos (epistemologia). Certamente faremos julgamentos éticos, e agiremos com propósito (ainda que seja o de sobreviver... e ainda teríamos que nos perguntar o pra quê ficar vivo). Esses, e uma infinidade de outros exemplos podem mostrar como é inevitável que tenhamos uma cosmovisão. A questão é que, “em geral, nossas cosmovisão repousa tão profundamente entremeada em nosso subconsciente que, a não ser que tenhamos refletido longa e arduamente, não temos consciência do que ela é” (SIRE, 2009, p.19). Podemos deter uma cosmovisão falsa e estarmos enxergando o mundo de maneira errada, uma vez que, como observa Nash:

Cosmovisões funcionam de modo semelhante aos óculos. As lentes corretas, tal como a cosmovisão correta, podem mostrar o mundo de maneira mais clara. Quando as pessoas olham o mundo por meio de cosmovisões erradas, a realidade não lhes fará sentido (NASH, 2008, p.14).]
Nós propomos que a cosmovisão cristã é a única verdadeira e satisfatória. Doravante, analisaremos como testar a veracidade das cosmovisões (uma abordagem útil para todo tipo de apologista).

parte 3
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BIBLIOGRAFIA:

CHEUNG, Vincent. Questões Últimas. Tradução de Marcelo Herberts. Brasília: Monergismo, 2009. 143 p.

GAARDER, Jostein. O mundo de Sofia: romance da história da filosofia. Tradução de João Azenha Jr. São Paulo: Companhia das Letras, 1996. 560 p. 

NASH, Ronald H. Questões Últimas da vida: uma introdução à filosofia. Tradução de Wadislau Martins Gomes. São Paulo: Cultura Cristã, 2008. 448 p.

SIRE, James W. O universo ao lado: um catálogo básico sobre cosmovisão. Tradução de Fernando Cristófalo. 4. Ed. São Paulo: Hagnos, 2009. 384 p.

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