terça-feira, 5 de setembro de 2017

Os Presbiterianos e o Sábado, segundo Adventistas

O artigo adventista intitulado, Os Presbiterianos, a Lei e o Sábado, apresenta uma imagem a respeito da teologia oficial presbiteriana, para que de alguma forma ofereça subsídios para a defesa adventista a respeito do Sábado. Quero fazer alguns apontamentos a respeito desse artigo. Apesar de que o sábado se efetivou no Adventismo via Ellen White e suas visões, vou fazer uma avaliação sobre o artigo desconsiderando esse fator nevrálgico.

1. O patrono do presbiterianismo. O autor do texto fala que o Reformador João Calvino, é o mentor da teologia presbiteriana. Ele, porém, apenas deixou de mencionar que, em matéria de Sábado, a posição de João Calvino, não foi seguida exatamente pela teologia puritana, que produziu os Símbolos de Westminster. James M. Boice diz

“Em geral, há três abordagens para a questão do Sábado. Primeiro, tem sido ensinado por alguns que os cristãos devem guardar o sábado. Esta é a posição, por exemplo, dos adventistas do sétimo dia e também de outros. Segundo, há a visão de que o domingo é equivalente no Novo Testamento ao que é o Sábado no Antigo, e, portanto, é para ser guardado de maneira similar. A Confissão de Fé de Westminster chama o Dia do Senhor de Sabbath cristão [...] Terceiro, há a visão de que o sábado foi abolido pela morte e ressurreição de Jesus, e que um novo dia, O Dia do Senhor, que tem características próprias, substituiu-o. Essa foi a visão de Calvino que disse com clareza que “o dia sagrado para os judeus foi descartado e que outro [dia] foi colocado em seu lugar”. (Fundamentos da Fé Cristã, p. 203).

No livro Do Shabbath para o Dia do Senhor capítulo 11, demonstra que esse foi o fato. Nem Lutero, nem Calvino, defenderam uma postura idêntica daquela que viera a ser mantida pela Teologia Reformada posterior em seus postulados confessionais, no tocante ao quarto mandamento, em especial os de Westminster. Ainda que haja significativa semelhanças.

2. Os Dez Mandamentos – ‘resumidamente compreendida’. O artigo também cita a pergunta do Catecismo Maior de Wesminster que diz que a Lei Moral está “resumidamente compreendida” nos Dez Mandamentos. Precisamos qualificar melhor isso. A Lei Moral encontra um resumo, não seu detalhamento nos Dez Mandamentos. Possuem uma semente, que se expande em toda Bíblia. Jesus demonstrou isso no Sermão do Monte (Mt 5.21-32). Creio que uma diferença significativa aqui é que Adventismo tem um olhar muito místico nas duas tabuas, não seu valor pedagógico claramente pretendido, conforme advoga a Teologia Reformada. Nas tábuas da Lei não havia proibição nem punição para a fornicação entre solteiros, mas a lei exigia o casamento – caso o pai da moça não proibisse. Também, se compararmos a Lei em Êxodo 20 com Deuteronômio 5, percebe-se diferenças.

Veja um exemplo claro no Catecismo Maior de como o resumo é detalhado depois com inúmeras passagens bíblicas e em outras perguntas. Repare bem que a questão 123 recebe depois outras 10 questões de amparo para explicar o 5º mandamento:

123. Qual é o quinto mandamento? O quinto mandamento é: “Honrarás a teu pai e a tua mãe, para teres uma longa vida sobre a terra que o Senhor teu Deus te há de dar.” Ex 20.12.
124. Que significam as palavras “pai” e “mãe”, no quinto mandamento? As palavras “pai” e “mãe”, no quinto mandamento, abrangem não somente os próprios pais, mas também todos os superiores em idade e dons, especialmente todos aqueles que, pela ordenação de Deus, estão colocados sobre nós em autoridade, quer na Família, quer na Igreja, quer no Estado. Gn 4:20,21;45:8; II Rs 2:12;5:13; Is 49:23; Pv 23:22,25; I Tm 5:1,2;Gl 4:19. 125. Por que são os superiores chamados “pai” e “mãe”? Os superiores são chamados “pai” e “mãe” para lhes ensinar que, em todos os deveres para com os seus inferiores, devem eles, como verdadeiros pais, mostrar amor e ternura para com aqueles, conforme as suas diversas relações; e para levar os inferiores a cumprirem os seus deveres para com os seus superiores, pronta e alegremente, como se estes fossem seus pais. Ef 6:4; I Ts 2.7,8,11,12; I Co 4:14-16. 126. Qual é o alcance geral do quinto mandamento? O alcance geral do quinto mandamento é o cumprimento dos deveres que mutuamente temos uns para com os outros em nossas diversas relações como inferiores, superiores ou iguais. Ef 5:21; I Pe 2:17; Rm 12:10. 127. Qual é a honra que os inferiores devem aos superiores? A honra que os inferiores devem ao superiores é toda a devida reverência sincera, em palavras e em procedimento; a oração e ações de graças por eles; a imitação de suas virtudes e graças; a pronta obediência aos seus mandamentos e conselhos legítimos; a devida submissão às suas correções; a fidelidade, a defesa, a manutenção de suas pessoas e autoridade, conforme os seus diversos graus e a natureza de suas posições; suportando as suas fraquezas e encobrindo-as com amor, para que sejam uma honra para eles e para o seu governo. Gn 9:23; Ml 1:6; Pv 31:23,38,39; Lv 19:3,32; I Sm 26:15,16; I Rs 2:19;Sl 127:3-5; Mt 22:21; Rm 16:6,7; Ef 6:1,2; I Pe 2:13,1,18-20;4;3:6;  I Tm 2:1,2;5:17,18; Fl 3:17;Tt 2:9,10; Hb 12:9;13:7. 128. Quais são os pecados dos inferiores contra os seus superiores? Os pecados dos inferiores contra os seus superiores são: toda negligência dos deveres exigidos para com eles; a inveja, o desprezo e a rebelião contra suas pessoas e posições, em seus conselhos, mandamentos e correções legítimos; a maldição, a zombaria e todo comportamento rebelde e escandaloso, que vem a ser uma vergonha e desonra para eles e para o seu governo. Êx 21:15; Dt 21:18,20,21; Pv 19:26;30:11,17; I Sm 8:7;10:27; II Sm 15:1-12; Is 2:25;3:5; Sl 2:25;106:16; Mt 15:5,6. 129. Que se exige dos superiores para com os seus inferiores? Exige-se dos superiores, conforme o poder que recebem de Deus e a relação em que se acham colocados, que amem os seus inferiores, que orem por eles e os abençoem; que os instruam, aconselhem e admoestem, aprovando, animando e recompensando os que fazem o bem, e reprovando, repreendendo e castigando os que fazem o mal; protegendo-os e provendo-lhes tudo o que é necessário para a alma e o corpo; e que, por um procedimento sério, prudente, santo e exemplar glorifiquem a Deus, honrem-se a si mesmos, e assim preservem a autoridade com que Deus os revestiu. Dt 6:6,7; Cl 3:19; I Sm 12:23; Jó 1:5; Pv 29:15; I Rs 3:28;8:55,56; Is 1:17; Ef 6:3,4; Rm 13:3,4; I Pe 2:14;3:7; Tt 2:4,15; I Tm 4:12;5:8. 130. Quais são os pecados dos superiores? Os pecados dos superiores, além da negligência dos deveres que lhe são exigidos, são a ambição incontrolável, a busca desordenada da própria glória, repouso, proveito ou prazer; a exigência de coisas ilícitas ou fora do alcance de os inferiores poderem realizar; aconselhando, encorajando ou favorecendo-os naquilo que é mau; dissuadindo, desanimando ou reprovando-os naquilo que é bom; corrigindo-os indevidamente; expondo-os descuidosamente ao dano, à tentação e ao perigo; provocando-os à ira; ou de alguma forma desonrando-se a si mesmos, ou diminuindo a sua autoridade por um comportamento injusto, indiscreto, rigoroso ou negligente. Gn 9:21; Ex 34:2,4; Lv 19:29; Dt 17:17; I Rs 12:13,14; Is 56:10,11;58:7; Jr 5:30,31;6:13,14; Dn 3:4,6; Mt 14:8;23:2,4; Mc 6.4; Jo 5:4;7:18,46-48; At 4:18; Ef 6:4; I Pe 2:19,20; Fp 2:21;Hb 12:10. 131. Quais são os deveres dos iguais? Os deveres dos iguais são o considerar a dignidade e o merecimento uns dos outros, tendo cada um aos outros por superiores; e o alegrar-se com os dons e a promoção uns dos outros como sendo de si mesmos. Rm 12:10;15-16; Fp 2:3,4; I Pe 2:17. 132. Quais são os pecados dos iguais? Os pecados dos iguais, além da negligência dos deveres exigidos, são a depreciação do merecimento, a inveja dos dons, a tristeza causada pela promoção ou prosperidade dos outros, e a usurpação da preeminência que uns têm sobre outros. Nm 12:2; Pv 13:21; Is 65:5; Mt 20.15;25-27; Lc 15:28,29;22:24-26; Rm 13:8; II Tm 3:3; At 7:9; Gl 5:26; I Jo 3:12; III Jo 9. 133. Qual é a razão anexa ao quinto mandamento para lhe dar maior força? A razão anexa ao quinto mandamento, para lhe dar maior força, contida nestas palavras: “para que se prolonguem os teus dias na terra que o Senhor teu Deus te dá”, é uma promessa de longa vida e prosperidade, tanto quanto sirva para a glória de Deus e para o bem de todos quantos guardem este mandamento. Ex 20.12; Dt 5:16; I Rs 8:25; Ef 6:2,3.

Por que se dá isso? Porque o Decálogo possui um resumo da Lei Moral, não sua extensão. Daí a conclusão do autor do artigo, que o CMW diz que o Decálogo é “A DECLAÇÃO DA VONTADE DE DEUS”, é reducionista, e não apresenta com precisão o que o CMW disse nas partes indicadas por ele.

3. Deus deu a Lei antes da Queda. O artigo também ventila, sem melhores esclarecimentos, que Deus deu a Lei a Adão como pacto de obras. Sem perdermos espaço com a questão do pacto da obras, deve ser dito que Adão recebeu a Lei de Deus em primeiro lugar de forma positiva. ‘Não ter outros deuses, não fazer imagens, não matar, não adulterar’, etc, são proibições negativas que levam em conta um estado de pecado presente na pessoa e no mundo, que não estavam presentes no Éden, muito menos no céu. Obviamente, Adão recebeu em sua consciência a Lei Moral, e também a proibição expressa da proibição de comer o fruto. O renomado teólogo reformado Louis Berkhof nos explica:

“Essencialmente, a lei moral, como Adão a conhecia, era sem duvida semelhante aos dez mandamentos, mas sua forma era diferente. Em sua presente forma, a lei moral pressupõe o conhecimento do pecado e, portanto, é primordialmente negativa; no coração de Adão, porém, só pode ter tido caráter positivo. Mas justamente por ser positiva, não trazia à consciência a possibilidade de pecar. Portanto, foi acrescentado um mandamento negativo.” (Teologia Sistemática, p. 200).

Outro teólogo reformado, A. A. Hodge diz:

“[...] essa lei moral, pelo menos em princípios essenciais, e até onde era necessária para guiar os homens num estado de inocência, foi revelada na própria constituição da natureza do humana” (Confissão de Fé Comentada, p. 340).

Em segundo lugar, alguns detalhes da lei, não estavam presentes na eternidade, já que o descanso sabático decorre da criação, na eternidade não devemos achar que havia sábado!

4. Colossesnses 2.16. Na avaliação do articulista, no tópico anterior em sua postagem, ele chamou a atenção a distinção da lei, entre moral e cerimonial. Obviamente essa é uma distinção feita pela teologia, que não é declarada na Escritura. Nós que devemos fazer o julgamento entre lei e lei, para chegarmos à essa conclusão. Daí, ele introduz um texto muito debatido – Colossesnses 2.16.

Esse texto é interpretado de duas maneiras na tradição reformada, e o autor adventista omite isso, se é que ele o sabe. Uma interpretação, que é que tal texto prova ao menos que o sábado foi abolido. Podemos demonstrar em um exemplo. 

Vejamos o que João Calvino escreveu sobre esse texto:

...escreve o Apóstolo em outro lugar que o sábado tem sido uma sombra da realidade futura, e que o corpo, isto é, a sólida substância da verdade, que bem explicou naquela passagem, está em Cristo... Portanto, que esteja longe dos cristãos a observância supersticiosa de dias... ainda que o sábado esteja cancelado, entre nós, não obstante, ainda tem lugar isto: primeiro, que nos congreguemos em dias determinados para ouvir a Palavra, para partir o pão místico, para as orações públicas; segundo, para que se dê aos servos e aos operários relaxação de seu labor.” (As Institutas, Vol II p. 159).

A interpretação de Calvino sobre Colossenses 2.16,17 é diferente daquela mantida pelos interpretes confessionais puritanos que encaram esse texto como destacando os outros dias sabáticos, e não o quarto mandamento – nesse ponto os adventistas plagiaram a teologia puritana. Veja quando a CFW cita o texto de Colossesnsses 2.17:

III. Além dessa lei, geralmente chamada lei moral, foi Deus servido dar ao seu povo de Israel, considerado uma igreja sob a sua tutela, leis cerimoniais que contêm diversas ordenanças típicas. Essas leis, que em parte se referem ao culto e prefiguram Cristo, as suas graças, os seus atos, os seus sofrimentos e os seus benefícios, e em parte representam várias instruções de deveres morais, estão todas abrogadas sob o Novo Testamento. Heb.10:1; Gal. 4:1-3; Col. 2:17; Exo. 12:14; I Cor.5:7; II Cor. 6:17; Col. 2:14, 16-17; Ef. 2:15-16.

(Sempre insiro um qualificativo, na soma dessas interpretações reformadas: O sábado foi abolido pela substituição – digo isso por causa de minha concordância confessional com a CFW e com a exegética de João Calvino a respeito de Cl 2.16. Tire o texto de Cl 2.17 citado nessa parte da CFW, e sua doutrina continua a mesma.)

5. A desonestidade acadêmica. Nos pontos 6 ao 8, em especial o ponto 8, o autor demonstra sua ‘competência’ de dar impressões distorcidasEle não mencionou em nenhum momento nessas partes, as doutrinas oficiais presbiterianas a respeito do assunto. Por que não? Para omitir a continuidade da argumentação dos Símbolos de Westminster de forma a levar leitores a terem uma impressão que a defesa do sábado favorece a interpretação adventista! Ele não colocou a parte da CFW que responderia pergunta! Veja a pergunta que ele formulou:

“(8) Por Quanto Tempo Deve Durar o Mandamento do Sábado?” 

Daí ele falou dos comentários de presbiterianos que usam o termo sábado, mas ele não explica que para esses, “sábado cristão” é sinônimo de primeiro dia da semana, domingo, e não sétimo dia!

E se ele colocasse os Símbolos de Westminster que responderia a pergunta? Veja:

CFW: Como é lei da natureza que, em geral, uma devida proporção do tempo seja destinada ao culto de Deus, assim também em sua palavra, por um preceito positivo, moral e perpétuo, preceito que obriga a todos os homens em todos os séculos, Deus designou particularmente um dia em sete para ser um sábado (descanso) santificado por Ele; desde o princípio do mundo, até a ressurreição de Cristo, esse dia foi o último da semana; e desde a ressurreição de Cristo foi mudado para o primeiro dia da semana, dia que na Escritura é chamado Domingo, ou dia do Senhor, e que há de continuar até ao fim do mundo como o sábado cristão. Exo. 20:8-11; Gen. 2:3; I Cor. 16:1-2; At. 20:7; Apoc.1:10; Mat. 5: 17-18.

CMW: 116. Que se exige no quarto mandamento?  No quarto mandamento exige-se que todos os homens santifiquem ou guardem santos para Deus todos os tempos estabelecidos, que Deus designou em sua Palavra, expressamente um dia inteiro em cada sete; que era o sétimo desde o princípio do mundo até à ressurreição de Cristo, e o primeiro dia da semana desde então, e há de assim continuar até ao fim do mundo; o qual é o sábado cristão, que no Novo Testamento se chama Dia do Senhor. Gn 2:3; Is 56:2,4,6,7; I Co 16:2; At 20:7; Jo 20:19-27; Ap 1:10.

Omitir isso, foi evidentemente intencional!!!

Isso é adventismo...



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